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Falar bem é bom – Artigo da Revista Educação

Written by Bom Aluno Londrina

O poeta e crítico literário Octavio Paz escreveu: “Quando uma sociedade se corrompe, a primeira coisa que se degrada é a linguagem”. A linguagem desgastada e apodrecida reflete uma vida social sem rumo. As palavras degradadas perderam o sabor, a cor e o viço. Ficou só o vício.

Falar bem e ensinar a falar melhor é fundamental e básico. O respeito pelas palavras aperfeiçoa nosso respeito pela realidade e pelas pessoas. Sala de aula é lugar para conversar, e conversar bem. Lugar apropriado para experimentar a vida intensa das palavras.

A começar pela linguagem dos professores. A nossa expressão verbal afeta diretamente a realidade dos nossos alunos. Cuidar das nossas palavras é estratégia didática refinada. É conduta ética.

A ética na prática

Não faça aos outros o que não gostaria que fizessem a você. Esta é a regra de ouro. Vale para professores e alunos. Ninguém gosta de falar e ser desprezado ou desatendido. Ninguém gosta de ser impedido de falar, de expressar-se. Ninguém gosta de ser interrompido ao falar.

Falha quem nega ao outro o direito de falar. Mas falha também quem fala sem pensar ou, na sua fala, quer agredir e vencer o outro a qualquer preço, ou mesmo sem nenhum lucro. Diálogo não é duélogo. Vencer não é importante. O legítimo é tentar convencer, e estar disposto também a se deixar convencer.

Falar bem é ensinar a falar bem. Corrigir é menos eficaz do que mostrar como se faz. Se alguém disser: “Houveram casos”… basta dizer depois: “Sim, houve casos”. A gramática deveria ser afável como uma vovó. Aliás, na língua francesa esse trocadilho é possível: a grammaire (gramática) é nossa grand-mère (avó).

A língua materna deveria ser lanterna na escuridão dos conceitos confusos. A própria palavra “ética”, cuja função é iluminar consciência e atos, perdeu muito da sua credibilidade. Virou ética cética, palavra perdida em conversa jogada fora. Uma ética em que ninguém acredita, nem a plateia nem o próprio falante. Como crer numa ética patética que não tem vergonha de vir a público discursar sobre… ética?

Na ponta da língua

Falamos sozinhos. Falamos dormindo. Falamos de menos. Falamos demais. Às vezes temos a palavra certa na hora errada, ou a palavra errada na hora ainda mais equivocada. Ou as palavras se atropelam no trânsito difícil entre mente, coração e boca.

Algumas outras ideias sobre modos e maneiras de falar.

Qual é um dos temas preferidos dos professores? Os alunos, claro. (E os alunos adoram conversar sobre seus professores.) Trata-se então de pensar e falar bem dos alunos:

— Ah, aquele aluno vive batucando.
— Será um grande sambista!
— Ah, aquela outra fala demais.
— Será uma grande advogada!
— E aquele ali… aquele não fala nada.
— Será um grande monge, um contemplativo!

Falar dos alunos é interpretá-los com o máximo de boa vontade.

Falar com nossos colegas, os professores. Conversas docentes que nos ensinem a ensinar. A maestria também se aprende na sala dos professores. Indicações de leitura. Troca de informações sobre resultados e experiências. Certa vez, porém, uma professora disse-me que a sala dos professores da sua escola era um autêntico serpentário. Fiquei impressionado com a escolha da palavra. Ela explicou: “Falas venenosas existem. Não sejamos ingênuos”. Ela era professora de biologia.

Por vezes, a palavra está na ponta da língua. Mas tem medo de lançar-se ao espaço. Recua. Foge de nós. Por vezes, a palavra corre solta, brilha, encantada consigo mesma.

Por vezes, uma palavra se repete obsessiva, sem autocrítica. Ou então, depois de muito tempo, reaparece uma palavra que parecia perdida no tempo e esquecida para sempre, como “estouvado” ou “indubitável”.

Por vezes, a palavra foi e não tem como voltar. Por vezes, aquela palavra que dissemos numa aula ficou na boa memória de um aluno. E este aluno que você vai encontrar no futuro recordará: “Aquela sua palavra foi decisiva para mim”.

Leitura em voz alta

Uma antiga prática: a leitura em voz alta, e dentro da sala de aula. Ler a fala do texto, falar o texto com cadência e coerência. Dar voz ao autor e aprender do autor a colocar a voz em seu devido tom. Dar voz aos personagens de papel. Por que não experimentar de novo esse exercício coletivo, restituindo a calma e o prazer da leitura?

A propósito, falar é escolher um papel. Conheci um professor muito tímido que venceu sua dificuldade de expor-se, ao criar para si um personagem e uma voz própria. O seu personagem era ele mesmo: um professor que vencia a timidez. E, interpretando o professor que ele de fato era, falava o que tinha a dizer.

Citando Octavio Paz de novo: “A linguagem é o homem, mas também é o mundo. É história e é biografia: os outros e eu.” Não há livro sem leitor, nem fala sem ouvinte. Assim como um escritor cria seu leitorado, também os professores criam seu auditório quando se tornam autores de sua própria fala.

 

VIA REVISTA EDUCAÇÃO

Falar bem é bom

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